domingo, 15 de fevereiro de 2015

LUCY - A ESTRELINHA DA TERRA



Era uma vez uma estrelinha muito brilhante que vivia no céu iluminando tudo ao redor. Ela olhava para um planeta azul chamado terra e tinha uma enorme vontade de conhecê-lo. Muito perspicaz, a estrelinha percebeu que este planeta precisava de muita luz. Pensou que talvez pudesse ser mais útil na terra do que no céu, já que no céu já existiam muitas estrelas luminosas como ela e na terra não havia tantas estrelas assim. Pediu aos anjinhos que a deixasse ser uma estrelinha na terra. Prometeu que ofertaria toda sua luz deixando a terra mais linda e iluminando o caminho de estrelinhas pouco reluzentes que porventura vivessem ali. Os anjinhos lhe explicaram que na terra não existiam estrelas, mas que existiam muitos seres vivos que apesar de não serem estrelas possuíam uma luz que só os seres celestiais podiam enxergar. Confusa, a estrelinha perguntou o que eram seres vivos. Pacientemente, os anjinhos explicaram mencionando a natureza de cada ser que vivia na terra. Desejando muito trazer a sua luz para a terra, a estrelinha perguntou:
Vocês não poderiam me transformar num ser vivo? Eu poderia levar a minha luz para os seres que vivem na terra.
Qual ser vivo você gostaria de se transformar?
Diante de tudo que vocês me explicaram, acho que os seres humanos precisam de muita luz para não destruírem o maior patrimônio que possuem.
De fato, eles estão destruindo o maior tesouro que possuem; sua própria morada e, conseqüentemente, a própria vida.
Me deixe partir! Por favor! Sei que posso ser tão útil! Implorou a estrelinha.
Vamos pedir autorização ao Grande Deus e brevemente lhe daremos uma resposta. Ponderou os anjinhos.
A estrelinha esperava com otimismo e alegria a resposta de seus anjinhos amigos. Ela estava certa de que seria atendida. Sempre fora muito confiante e a sua luz positiva trouxe para si a exata resposta que esperava. Os anjinhos retornaram trazendo a resposta de Deus.
Você foi autorizada a nascer. Anunciaram os anjos.
Nascer? O que é nascer? Perguntou a estrelinha um pouco atordoada com tanta novidade.
Não tem como você cair na terra como se fosse uma estrela cadente transformando-se num ser nativo de lá. Todos os seres na terra nascem um dia. Você vai nascer como uma linda menina, terá uma bela família e um nome especial.
Família... Nome... O que é isto?
Família é como se fosse um grupo de estrelas muito especiais que conviverão com você e te amarão muito. O amor é uma luz muito forte que pulsa na maioria dos seres que vivem na terra. E, nome é como se fosse um chamado. É como você será conhecida.
Poxa, parece que as coisas na terra são bem diferentes das coisas aqui no céu.
Um pouco!.. Viva e verá! Desafiou os anjos.
Será que eu terei saudade das minhas amigas aqui do céu?
Assim que você nascer, você esquecerá tudo que viveu até agora. Só terá lembranças para as coisas que acontecerão lá na terra.
Vou perder todas as minhas lembranças?
Não. Elas ficarão guardadas aí dentro de você, mas não precisarão ser usadas lá na terra. Se você precisar de alguma lembrança, ela será liberada conforme a sua real necessidade. Nós estaremos sempre juntinhos de você administrando estas questões. Prometeu os anjos acalmando a estrelinha que começava a exalar certa ansiedade.
Eu vou me esquecer de vocês também? Perguntou receosa.
Acho que sim. Mas terá sempre a sensação de que estará sendo protegida por todos nós. Assegurou seus amigos celestiais.
A estrelinha ficou por alguns instantes um pouco pensativa refletindo profundamente sobre tudo aquilo. Depois de algum tempo, suspirou fundo e resolveu fazer uma pergunta intrigante:
Se as coisas funcionam assim na terra, será que acontece também assim aqui no céu?
Como assim? Perguntaram os anjinhos.
Será que antes de ser estrela do céu eu era uma outra coisa qualquer. Será que perdi também a memória daquilo que eu era antes de ser uma estrela?
Os anjinhos não lhe deram uma resposta. Só levantaram os ombros e as sobrancelhas sinalizando uma indagação. Interrompendo as divagações da estrelinha, ordenaram:
Se queres partir, prepare-se. Daqui a poucos minutos uma linda menina chamada Lucy estará nascendo. Você será a energia e a luz que preencherá o corpo e a vida dela. Aceita o desafio de ser gente?
Com todo prazer! Finalizou a estrelinha.
Antes que pudesse pensar em qualquer coisa a respeito, uma luz gigantesca envolveu a estrelinha fazendo-a renascer aqui na terra. Neste momento o sol, a lua e milhares de estrelas  deram suas mãos de luz fazendo uma linda oração para que a terra pudesse acolher com alegria e gratidão a linda estrelinha que o universo lhe ofertara.
Nasceu Lucy, uma linda menina, perspicaz, ativa, amorosa e muito inteligente. De todas as qualidades que Lucy tinha, a sua grande coragem chamava atenção de todos. Era uma criança que aceitava todos os desafios e lutava bravamente por tudo que desejava. De tão confiante que era chegava a causar admiração em uns e incômodo em outros. Não temia nada. Na verdade, quase nada. Lucy tinha um único medo do qual não conseguia se livrar. Todas as noites, quando se deitava para dormir, ela vivia um pesadelo. Era como se fosse um sonho acordada. Ela via estrelinhas sem brilho, de cara triste e zangada, e ao mesmo tempo, estrelas luminosas e felizes reluzindo no teto de seu quarto. Ficava assustada, pois seu quarto, às vezes, ficava parecido com o céu noturno da terra, repleto de estrelas. Temerosa, sem saber o significado daquela experiência e sem saber o que aquelas estrelas reluzentes e sem brilho pudessem fazer com ela, fechava os olhinhos e chorava baixinho para ninguém ouvir. Ficava com vergonha de dizer para as pessoas que estava vendo aquelas coisas estranhas.  Mas, certo dia, o medo ficou tão grande que se transformou em pavor e o pavor em uma grande tristeza que fez Lucy chorar muito alto. Sua mãe, ouvindo seus soluços, correu até o quarto de Lucy para ver o que estava acontecendo. Mais assustada que a filha, a mãe perguntou ansiosa sem saber o que estava acontecendo:
O que houve, minha filha?
Mamãe, eu estou com muito medo. Desabafou Lucy aos prantos.
Medo de que, filhinha? Perguntou a mãe confusa abraçando a filha.
Das estrelas. Respondeu soluçando.
Mas, as estrelas são tão belas. Elas não podem lhe fazer mal.
Tenho medo das estrelas sem brilho e tristonhas que aparecem no teto de meu quarto.
Não existem estrelas aqui, Lucy.
Elas se apagaram assim que você entrou aqui. Justificou a menina.
Fique tranqüila, filhinha. Você deve ter tido um sonho ruim. Durma, isto tudo vai passar. Amanhã você já não se lembrará disto e a vida vai continuar tranqüila.
Não, não! Fique aqui comigo, mamãe. Sei que não vai passar. Eu sempre vejo estas estrelas no teto de meu quarto. Só que hoje a cara das estrelas tristes estavam ainda mais tristes. Haviam estrelas zangadas também. Só hoje tive coragem de lhe contar. Elas vão voltar! Elas sempre voltam. Desabafou Lucy agarrando a mãe impedindo-a que esta saísse do seu lado.
A mãe de Lucy era muito sábia e sabia exatamente como ajudar a filha. Quando criança teve alguns medos parecidos com os de Lucy. Fora ajudada a combatê-los por intermédio da Vovó Zica que de tudo sabia um pouco. Aproveitando os ensinamentos da avó e olhando fundo nos olhos da filha tratou de lhe passar alguns conselhos.
Filhinha, você quer acabar com este medo?
É o que mais quero, mamãe.
—Então ouça com atenção a receita da vovó Zica para acabar com o medo. Ela me ajudou a acabar com o meu e eu lhe ajudarei a acabar com o seu.
Que bom, mamãe! Eu não verei mais estas estrelas?
Calma, vou lhe explicar como tudo deverá funcionar. Existem algumas regras que você deverá seguir e respeitar.
Quais? Perguntou curiosa, sentando-se no colo da mãe.
A primeira delas é nunca guardar seu medo na caixinha escura.
Mamãe, eu nunca guardei meu medo em nenhuma caixinha.
Guardou sim, filha. Veja bem, só hoje você me falou dele. A caixinha escura é o pedacinho que a gente não conhece dentro da gente mesmo.
Quer dizer que existe um pedaço da gente que a gente desconhece? Quer dizer que eu não me conheço direito?
É isto mesmo! Precisamos jogar luz neste pedacinho escuro para que possamos enxergar o que está guardado lá. Todas as vezes que você fala daquilo que teme, daquilo que lhe provoca qualquer sentimento ruim, você está colocando para fora, tirando da caixinha escura o que não pode ficar contido lá. Sentimento ruim preso dentro da caixinha cresce e explode em forma de pavor. Assim, fale sempre de seus sentimentos para as pessoas que você ama e confia. O amor e a confiança destas pessoas são sentimentos de luz que ajudarão a iluminar este seu lado escuro. Expresse seus sentimentos. Não banque a egoísta guardando-os só para você. Admita que precisa ser ajudada ao invés de fingir que está tudo bem.
Se eu fizer isto o meu medo desaparecerá? Perguntou Lucy irradiando a luz da esperança em seus olhinhos verdes.
Parte dele desaparecerá. Existem outras regras para espantar a outra parte.
Me ensine mamãe, eu prometo que seguirei a risca.
A segunda regra é enfrentar o seu medo ao invés de fugir dele. Tudo que a gente foge nos persegue.
Como é que posso enfrentar as estrelas de meu quarto? É fácil enfrentar as estrelas de luz, mas, as de cara feia... Ai, nem consigo pensar como posso fazer isto!
Você pode fazer isto conquistando a certeza de algumas coisas. Pontuou a mãe.
Que coisas?
Você precisa saber primeiro por que vê estrelas.
Como posso descobrir?
Eu posso lhe contar.
Quer dizer que você sabe porque eu vejo estrelas?
Se eu não soubesse, correria o mundo inteiro até descobrir para lhe contar. Exclamou a mãe externando seu grande amor pela filha.
Se eu tivesse tirado meu medo da caixinha escura antes, talvez a senhora já tivesse me contado. Por que não fiz isto antes? Indagou-se arrependida.
Tá vendo como é importante tirar o medo da caixinha? Relembrou a mãe.
Já que sabe por que vejo estrelas, me conte rapidinho. Perguntou Lucy irradiando ansiedade.
Outra regra importante é não ter pressa para acabar com seu medo. Só a paciência e a perseverança nos ajuda enxergar o que está no escuro. Não desista de encontrar estrelas dentro de ti. Ao invés de encontrá-las apenas no teto de seu quarto, descubra a sua estrela e aproveite a luz das estrelas felizes que você vê e gosta para iluminar muita coisa aí dentro. Aconselhou a mãe tocando com a ponta de seus dedos no peito de Lucy.
Será que tenho estrelas dentro de mim?
Ou será que você é também uma estrelinha bem iluminada? Você ilumina tanto a nossa vida que eu não posso pensar diferente. Falou a mãe sorrindo.
Não estou entendendo, mamãe.
—Deixe eu explicar melhor. Quando a gente tem muita luz, esta luz faz a gente enxergar coisas que a maioria das pessoas não conseguem ver. É como ascender a luz de um quarto escuro. A gente passa a ver melhor tudo que está dentro dele.
—Ah! Já entendi. Quer dizer que eu vejo estrelas, pois meus olhos conseguem ver o que os olhos dos outros não conseguem ver.
—Isto mesmo! Mas é importante que você saiba que isto é uma benção e não uma coisa ruim. Ao invés de enxergar isto como um problema, veja tudo isto como uma oportunidade de crescimento. Você só consegue enxergar mais porque a luz do seu olhar é mais forte e intensa. Você só consegue enxergar mais porque você tem mais poder. Por isso, não pode fechar seus olhos para aquilo que vê. É neste ponto que entra a próxima regra.
—Opa! Estou começando a gostar desta história. Me fale qual é a próxima regra, mamãe. Não vejo a hora de colocá-la em prática.
—Use o seu poder e não o seu medo para lidar com tudo isto. Use o poder de sua luz para iluminar seu lado obscuro. Sorria para as estrelas tristonhas e zangadas. Irradie e oferte a sua luz   para elas. Enfrente o mal humor delas com sua alegria e capte ainda mais a energia das estrelinhas que você gosta intensificando a luz que reluz dentro de ti.
Lucy deu uma gargalhada como se tivesse feito a maior descoberta de sua vida. Olhando nos olhos da mãe, viu uma linda estrela brilhando lá no fundo.
—Mamãe, agora estou vendo estrela no seu olhar.
—Será que vai ficar com medo de mim agora? Perguntou a mãe num tom de brincadeira e fazendo cócegas na barriga da menina.
—É claro que não! A sua estrela é linda! Não tenho medo dela. Você me ajuda a olhar as estrelas de meu quarto e enfrentá-las?
—É claro, filhinha! Eu vou adorar conhecer as suas estrelas. Vou fazer cócegas nas estrelas tristonhas. Quem sabe eu posso descolar um sorriso delas da mesma forma que consigo descolar esta gargalhada gostosa que sai da sua caixinha de som.
—Só faltava essa! Agora eu tenho também caixinha de som! Ironizou Lucy.
—Ichi! Se você soubesse quantas caixinhas guardamos dentro da gente. É caixinha escura, caixinha de som, caixinha surpresa, enfim, é caixinha que não acaba mais.
—Mamãe posso lhe contar um segredo? Perguntou Lucy cochichando no ouvido da mãe.
—“Pode”, não –  “Deve”. Nunca se esqueça da primeira regra. Advertiu a mãe.
—Mamãe, tenho que admitir que pela primeira vez desejo ver as estrelas no teto do meu quarto para mostrá-las para você.
—Como já lhe disse, vou adorar conhecê-las. Você acha que consegue vê-las agora?
—Não estou conseguindo, mamãe.
—Sabe por que filhinha?
—Por que? Perguntou ansiosa.
—Porque seu medo já está acabando. Durma e amanhã quem sabe... Talvez você consiga vê-las. Me chame para eu ajudá-la a fazer graça para as estrelas sem luz. Acho que elas precisam de amigos e de muita alegria.

Naquela noite Lucy dormiu e sonhou que era uma estrela parecida com as estrelinhas luminosas que apareciam no teto de seu quarto. Sonhou que as feias estrelinhas eram estrelinhas perdidas no universo. Perdidas, perderam a luz. Lucy ao invés de fechar os olhos para elas, oferecia o seu olhar, o seu sorriso e a sua atenção. Ao fazer isto todas as estrelas se enchiam de luz curando sua expressão de dor e sofrimento. Lucy acordou feliz. Descobriu que tememos apenas aquilo que desconhecemos. Que ao cuidar daquilo que temia, o medo desaparecia. Se a gente não foge do medo é ele que foge da gente. Agora, ela sabia que não tinha mais motivo para temer. Conhecia bem o seu poder e a sua luz. Não sabia explicar, mas tinha também a sensação de que era muito protegida por algum anjinho no universo. Confiava não só na proteção de seus anjinhos, mas também no poder de sua luz. Sabia que precisava levar sua luz a todos os seres que estivessem sem brilho. Todas as noites ia para cama querendo ver estrelas no teto de seu quarto. Queria apresentá-las a sua mãe. Mas, por incrível que pareça, nunca mais conseguiu ver estrelas no teto de seu quarto por mais que quisesse enxergá-las. Aprendeu a olhar para o céu para contemplar estrelas de diferentes brilhos. Aliás, o céu sempre foi mais belo que o teto de seu quarto.  E, com este olhar diferente, passou a perceber que existem também pessoas com brilhos diferentes. No meio de tanta gente feliz e em paz existem pessoas tristes e zangadas. Jamais teve medo das pessoas parecidas com as estrelas que um dia temera. Sabia como enfrentá-las. Sabia mais que enfrentá-las; sabia ajudá-las. Descobriu que por trás de uma cara feia existe muito medo e fragilidade. Superado seu medo, Lucy cresceu e passou a vida se dedicando a levar mais luz para quem dela necessita. Ficou conhecida por todos como Lucy – a estrela da terra. 

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