segunda-feira, 23 de abril de 2012

A DOR DA VERDADE


Dedico esta história às duras verdades que precisam ser reveladas com brandura


Zumbeta era uma abelha infeliz. Tinha uma auto-estima muito baixa  e  se achava pior que as outras criaturas.  Sofria muito por conta disto. Querendo ajuda-la, os seres elementais  resolveram contrata-la para uma tarefa muito importante. Pensavam: “Se ela é uma abelhinha ferida emocionalmente, talvez tenha mais cuidado para tratar a ferida dos outros seres, por sentir na pele a própria dor”. Os seres elementais sabiam que a empatia é muito importante para desencadear em todos nós o desejo de tratar o outro com mais cuidado e carinho. Empatia é a nossa capacidade de se colocar no lugar do outro. Cientes disto, convocaram uma reunião com Zumbeta para incumbi-la de uma missão importante que pudesse fazer com que se sentisse importante também.
- Estamos precisando de mensageiros da verdade.  Sabemos que voce possui capacidade para exercer com maestria este cargo. Apesar dos ferrões, tens muita doçura dentro de ti. Precisamos de seres que possam adocicar a verdade, torna-la mais leve antes de ser evocada. Esta postura protege e faz com que a dureza da mentira que esconde a verdade não machuque tanto ao ser extirpada. Apesar de já ter sido convocada para este cargo tão importante, passará por um teste para verificarmos se está suficientemente preparada para exercer com sabedoria uma missão tão nobre.
Zumbeta ficou muito feliz! Num passe de mágica viu a sua autoestima transformada. Sentia-se, agora, uma criatura importante. Sentir-se importante é algo muito bom, no entanto, se torna algo ruim quando passamos a nos sentir mais importantes que o outro. Infelizmente, foi esta transformação que aconteceu com Zumbeta. Sentindo-se mais importante que as outras criaturas por ser designada para uma missão de grande excelência,  tratou de usar o seu poder para ferir e não para cuidar. Passou de oprimida para opressora. A sua primeira missão já foi um grande fracasso. Com seu zumbido forte tratou de espalhar, sem discrição,  a todos os seres da redondeza uma verdade que deveria ser exclusividade de Formosa, a formiga mais trabalhadeira dos arredores. Zumbindo e zombando escarniava:
-Verdade é para ser dita e não para ser contida!
Espalhou a todos uma verdade que pertencia apenas a um único ser. Gerou uma grande ferida em Formosa. Doída, não conseguia sequer  trabalhar. Trabalhar é coisa que formiga sabe fazer bem, mas ferida por uma verdade mal contada, pode se sentir amputada. Demorou muito tempo para Formosa se reestabelecer.
Na sua segunda e última apresentação da verdade, agiu de forma ainda mais dura. Usou o seu ferrão e não o seu mel para oferta-la a Pedroso , o tatu mais preguiçoso da região. Fincou o seu ferrão no casco duro de Pedroso e escarniou:
- Uma boa ferroada acorda e levanta. Durma com esta!
Depois disto tudo, Zumbeta foi demitida de seu cargo. Sentindo-se injustiçada, procurou os seres elementais para esclarecer os motivos de sua demissão.
- Que injustiça! Voces me deram um cargo importante e o toma de mim num passe de mágica? Tratei de cumprir a minha missão rapidamente e com a firmeza que uma autoridade requer para garantir credibilidade e respeito. No entanto, ao invés de palmas, recebi uma carta de demissão. O que está acontecendo? Zumbiu zangada.
- Está acontecendo tudo que não poderia acontecer nunca. E, diante de tudo que aconteceu, sentimos que, neste momento especificamente,  voce não está ainda preparada para esta missão. Acho que precipitamos. Talvez, esteja preparada para um outro cargo.
- O que eu fiz de errado? Zumbiu Zumbeta.
- Voce ofertou a verdade sem acolchoa-la com seu mel. Querendo ser rápida atropelou o tempo certo que o outro precisava para dar conta de acolhe-la. Não preparou o terreno arenoso da mentira para receber a semente da verdade. Num terreno árido, nenhuma semente, por mais valiosa que seja, pode desenvolver. Precisamos fertilizar a terra que receberá a semente da verdade. Voce teve pressa e desperdiçou sementes valiosas. Mas, entendemos a sua dificuldade. Não estamos julgando os seus erros. Acho que voce precisa de um preparo maior para exercer esta missão no futuro.
-  Mas, eu quero esta missão para agora. Isto não é justo! Perdi os meus melhores ferrões neste trabalho e sou demitida assim, sem perdas e danos.
- Em nenhum momento solicitamos a voce usar o seu ferrão, por menor que ele fosse. Aliás, pedimos que tomasse muito cuidado com os mesmos, pois sabíamos que voce poderia ferir. Voce foi incentivada a usar o seu mel e não fez isto.
- Com muita doçura, ninguém iria acreditar naquilo que eu estava dizendo. Eu não seria respeitada. Justificou Zumbeta. 
- Mas, voce não foi contratada para ser respeitada. Voce foi contratada para levar a verdade e o respeito que deve acompanha-la a todos os seres que dela precisasse. Um ser vitimado pela mentira sofre muito ao ter que arranca-la de dentro de seu ser. A verdade tem que entrar como um hidratante para amaciar a secura , a rudeza e os estragos que uma mentira causa na pele emocional de um ser. Voce feriu ainda mais usando o seu ferrão.
- Fiz tudo isto com as melhores intenções. Afirmou Zumbeta querendo se justificar.
- Acreditamos nas suas boas intenções. Aliás, de boas intenções o mundo está cheio. Antes de agirmos com boas intenções, precisamos apenas avaliar se o outro necessita desta intenção que desejamos ofertar.
- Como assim? Perguntou, confusa, a abelhinha Zumbeta.
- Nada melhor do que uma boa prática para voce entender isto. Daremos a voce uma missão tão importante quanto a anterior.
- Verdade! Exclamou Zumbeta.
- Verdade! Confirmaram os seres elementais.
- Que missão tão importante é esta?
- Voce terá, agora, a grande missão de levar a verdade  a si mesma. Quando souber fazer isto bem, será readmitida para levar a verdade ao outro. Prepare o terreno do seu coração com sua melhor intenção. Voce merece!
Zumbeta achou estranha aquela nova missão. No início não gostou muito dela, mas tratou de comprometer-se, pois sabia que se desse conta do recado seria readmitida. Demorou muito tempo para Zumbeta compreender que a verdade não é dura. Dura é a mentira que encobre a verdade. À medida que esta abelhinha foi tomando consciência de suas mentiras e se comprometendo com suas verdades, uma linda colmeia foi sendo construída. Hoje, a colmeia de Zumbeta é a maior e mais produtiva da região. Todos  os seres feridos  pela mentira buscam na doçura de seu mel uma medicação  para tratar a dor. Zumbeta, de abelha “zumbeteira”  passou a ser conhecida por todos como a abelhinha do bem.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

SEGREDO DO CORAÇÃO

 Dedico esta história a todos aqueles que não desvendaram ainda o seu segredo mais profundo


Era uma vez uma alma muito especial, daquelas que possuem uma luz diferente. Almas assim são escolhidas para missões muito importantes. No dia dela partir para a terra, o seu anjo da guarda guardou em seu coração um segredo, advertindo-o:
- O segredo só será revelado no dia em que você descobrir a chave do seu coração. Deverá partir e a sua missão lá na terra será, sobretudo, descobrir este segredo. Toda vez que você se distanciar desta missão o seu corpo irá lhe lembrar, principalmente, o seu coração.
-O que deverei ser? Perguntou cheio de curiosidade.
-Seja o que quiser. Terá muitos talentos e não será nada fácil exprimi-los. O seu talento também lhe mostrará a chave do seu coração.
E assim, aquela alma partiu para a terra. Nasceu um homem. Quando criança se posicionava de uma forma um pouquinho diferente das outras. Não tinha talento para o futebol, como a maioria, e não gostava de dar uma de machão. Sofria, pois é um sufoco ser diferente da maioria. Tinha inspiração para a arte, mas não lhe era concedido o direito de expirar o seu talento para o mundo. Inspirando, inspirando, inspirando, sem, contudo, expirar, transformou-se num asmático. Passou a ter alergia de um mundo que não desejava respirar, o mundo que a maioria dizia ser correto. Que sufoco viver assim! Se corria para o mundo do seu talento, o mundo lá fora rejeitava e reclamava, por outro lado, se dirigia a este mundo de fora, o seu corpo berrava. A quem agradar? Para viver tranquilamente achou que deveria convencer as pessoas que o seu mundo artístico era saudável e rico. Cresceu tentando convence-las e foi se esquecendo de convencer a si mesmo de que era uma pessoa especial, iluminada e talentosa. Buscava o seu brilho nos olhos opacos de pessoas que jamais conseguiriam ter sensibilidade para a arte. Convencimento foi se tornando a sua meta principal, no entanto, esta parecia não ser a chave do seu coração, pois ao invés de ouvir os elogios que tanto desejava, ouvia a voz exaltada do seu coração e os gritos de seu corpo dilacerado por sintomas insuportáveis tentando lembrá-lo de sua verdadeira missão. Tendo também que engolir muita coisa que não concordava, fez  o seu estômago falar mais alto: – “Toda vez que você engolir aquilo que deseja vomitar, eu vou gritar”.
Esquecido de que o seu corpo lhe serviria de mensageiro pela vida afora, buscava nos médicos uma explicação biológica para os seus problemas. Sempre encontrou, pois é esta a missão da medicina – “descobrir doença onde a gente cultiva”. Passou a cultivar tantas doenças que foi se esquecendo da sua missão – encontrar o segredo guardado no seu coração.
Perdido, criou a ilusão de que se ficasse o dia inteiro desenvolvendo apenas o seu mais notável talento, chegaria a ficar igual a alguns mestres, podendo finalmente convencer. “Convencer” tornou uma obsessão e não um resultado. Bastava esta palavrinha surgir em sua mente para o seu corpo berrar. E, tinha mais... Toda vez que se deparava com alguém convencido, seu corpo voltava a gritar. Parecia dizer:
-Olhe que ridículo! O caminho não é este.
O mais engraçado nesta história, é que esta linda alma morria de medo de dar um ataque do coração, pois, inconscientemente, sabia que lá estava escondido o seu segredo. O seu coração gostava de brincar com este seu medo. Queria vê-lo mais corajoso, assim, de vez em quando, só para desafia-lo, simulava uns ataques. Deixava, inclusive, a pressão subir de forma proporcional à pressão que ele exercia sobre si mesmo.
O tempo foi passando e a desilusão foi batendo à sua porta. Já estava ficando insuportável viver quando finalmente foi visitado por um gênio que carregava em suas mãos uma preciosa lâmpada. Surgiu como num encanto, exclusivamente, para lembra-lo:
-Você se esqueceu de buscar o seu segredo?
-Não. Mas, para alcança-lo eu preciso primeiro ser apreciado.
-Por quem?
-Por...
Naquele momento, como numa mágica, percebeu que já era apreciado por muita gente.
-De quem você precisa? Perguntou o gênio num tom de desafio.
-De...
-Você precisa do mundo inteiro batendo palmas para você? Vou lhe conceder a graça de três pedidos. Tudo que pedir lhe será dado.
Naquele momento seus olhos se encheram de luz. No entanto, antes que começasse a fazer seus pedidos, seu corpo começou a gritar. Foi parar no hospital e perdeu o gênio de vista.  Desiludido, pensava inconformado:
-Agora que eu iria realizar o meu desejo...
Transcorreu muito tempo e o gênio voltou.
-Por que você desapareceu logo na hora que eu iria fazer o meu primeiro pedido?
-O primeiro pedido foi feito pelo seu corpo. Pediu que eu voltasse agora e eu voltei para lhe conceder a graça dos outros dois que faltam.
-Qual foi o pedido feito por meu corpo? Perguntou exasperado e colérico.
-Seu corpo me pediu que eu fosse embora. Acho que ele percebeu que você faria o pedido errado naquela ocasião.
-Pedido errado? Isso é problema meu!
-Só seu, realmente. No entanto, parece que existe algo maior que deseja vê-lo livre deste problema.
-Que problema?
-Do problema que você criaria para você mesmo.
Aquele homem que às vezes agia como uma criança impulsiva e imatura ficou ali parado, pensativo, refletindo na imensidão de problemas que o atormentavam. A vida continuava sendo um sufoco. Percebeu que a frustração que o corpo lhe impusera talvez fosse uma forma de faze-lo parar, pensar e refletir. Se não fizesse o pedido certo, perderia os outros dois que lhe restaram, pois o seu corpo daria um jeito de interceder; o corpo ou algo maior do que ele. Depois de muita reflexão, fez finalmente o seu segundo pedido:
-Me tire do sufoco! Suspirou.
O gênio, acendeu a sua lâmpada mágica criando um alo de luz ao redor daquele homem já inconformado com aquela vida que parecia não dar certo.
-Está realizado o seu pedido, mas se desejar continuar no sufoco a escolha é sua.
-Não estou vendo nada de concreto.
-Verás. Mas, saiba vivenciar e utilizar a conquista advinda deste pedido de forma inteligente e para o seu bem. O que você ganha agora é seu por merecimento e não por piedade. Faça seu terceiro pedido.
Sem saber a procedência de palavras que brotaram de sua boca sem o seu controle, implorou:
-Desejo encontrar a chave do meu coração. Preciso desvendar um segredo. Acho que este segredo é a minha salvação. Não suporto mais afundar nesta lama de problemas...
Antes que prosseguisse o gênio completou.
-Que você mesmo criou.
-Pode ser... sei lá. O que importa é que não quero isto mais. Chega!
Mais uma vez o gênio esfregou a sua lâmpada mágica e disse:
-A chave do seu coração já está nas suas mãos desde o nascimento. Use-a.
-Mas, eu não consigo ver nada.
-Mas, já é suficiente saber que ela está nas suas mãos.
Finalizada estas palavras o gênio desapareceu.
-A chave do meu coração está nas minhas mãos... Se desejar continuar no sufoco a escolha é sua...Repetia, incessantemente, para si mesmo.
Sem desejar ter controle de tudo, principalmente da visão que julgava ser saudável as pessoas possuírem sobre a vida e sobre si mesmo, deixou finalmente a vida transcorrer livremente. Como num passe de mágica, muitas conquistas aconteceram. A sua vida financeira mudou, arranjou um novo amor, realizou antigos projetos e viagens sonhadas desde a sua infância. Apesar de tudo, o sufoco continuava. A frase do gênio se repetia em sua cabeça como um disco arranhado. “Se desejar continuar no sufoco a escolha é sua”...
E, a chave do seu coração? Estava nas suas mãos e não conseguia enxergá-la. Sem enxergá-la, como poderia usa-la? Sem utiliza-la como poderia desvendar o seu segredo? Precisava de uma resposta e o seu inconsciente tratou de agir rápido. Trouxe num sonho uma mensagem que desvendava uma parte do seu conflito. Sonhou que um monstro horrível chamado idéia o perseguia em todas as fases de sua vida. Tomado por um medo incontrolável, se viu criança, adolescente e adulto perseguido por este monstro terrível. Acordou com o coração palpitando fortemente, tomado por uma taquicardia semelhante à palpitação desprazerosa experimentada em suas crises de ansiedade. À partir daí, novos questionamentos transbordaram em sua mente.
-Em meio a tantas ideias boas e ruins, preciso separá-las e identificar as idéias negativas que me perseguem desde a infância.
Resolveu criar elos de identificação numa tentativa de conseguir uma resposta. Procurou se lembrar com qual criança mais se identificou pelas caminhadas de sua vida. Lembrou-se de um garoto inteligente e vivaz considerado,  porém,  medíocre e tímido pela maioria. Conheceu este garoto em uma de suas viagens e conseguira despertar a essência adormecida do mesmo oferecendo de presente a companhia da sua criança também tão reprimida e incompreendida no passado. A identificação destas crianças discriminadas pelo meio em que viviam tornou-se o principal elo de libertação para ambas.
Transitando por sua adolescência deparou-se com o conflito de sua enteada adolescente diante do desejo de tomar a arte como trajetória de vida. Brincando, assumindo o papel do pai incrédulo e do opressor de talentos, desestimulava aquela adolescente de alma artística a seguir o seu caminho, mostrando o seu espelho como um obstáculo de difícil transposição. Mas, parece que a sua brincadeira não assustou a adolescente que utilizou este espelho como a sua referência mais importante e um grande estímulo para seguir em frente. Que ironia! De repente se viu transformado num exemplo de vida. Tão empacado durante a mocidade, se viu repentinamente transformado num estímulo para quem deseja prosseguir.
E o seu adulto, com quem se identificava? Pensou em seus ídolos – pessoas que jamais o utilizaria como instrumento de libertação e estímulo. Inatingíveis? Certamente. Percebeu que precisava atingir primeiro o adulto frustrado que residia dentro de si, mostrando a ele o seu talento e não somente o talento dos mestres que tanto apreciava. Precisava construir uma vida para este adulto bem diferente da vida dos grandes astros. Não poderia viver de obsessões, precisava viver também os anseios de seu coração. Ele desejava uma vida iluminada pelo amor e não pela fama. A sua mente poluída pela idéia de ser um astro que convencesse não conseguiu convencer e nem realizar o seu intento. Chegara a hora de deixar o amor imprimir em sua mente uma idéia diferente – a idéia de que era um ser genial. GE- NI- AL!!!!!!! Deu uma grande risada ao perceber que o gênio da lâmpada era ele próprio. Este gênio só apareceu quando cedeu um espaço de luz para a sua mente sábia se expressar. Despoluída, ela poderia agora escolher os desejos certos. Percebeu que ao esfregar a lâmpada mágica esfregara, na verdade, a sua mente, as idéias sujas, deixando-as finalmente cristalinas.
Num passe de mágica tudo mudou. Passou a se permitir criar e vivenciar tudo que, anteriormente, sua mente suja não permitia. A vida passou a ter mais encanto. O corpo parou de gritar e o seu coração agora só palpitava de amor; uma palpitação diferente, forte, porém, gostosa de sentir. Pôde também respirar profundamente. Que alívio!
Depois destas encantadoras descobertas pôde enxergar a chave do seu coração. Ela estava realmente nas suas mãos. Só que não precisava mais dela para desvendar o seu segredo. Ao desvendar-se desvendou-o concomitantemente. Finalmente teve a absoluta certeza de que sua maior missão era ser feliz, muito feliz.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

O CACHORRINHO AMIGO


Dedico esta história a todas as crianças que não conseguindo expressar a sua dor mostram os “dentes”.

 

Teteco era um cachorrinho muito amoroso e feliz. Gostava de brincar muito com sua mãe, com seu pai e com todos seus amiguinhos. Apesar de Teteco ser muito feliz, ele tinha um probleminha que o deixava triste, muito triste mesmo. Ele não conseguia latir como os outros cachorrinhos e nem sempre conseguia ser compreendido por eles.

Não sei se vocês sabem, mas os cachorrinhos se comunicam de várias formas. Através do olhar, dos gestos e do latido. E, como Teteco não conseguia latir como os outros cachorrinhos, teve que encontrar uma outra forma para se comunicar. E, a forma que Teteco encontrou não agradou nada seus amiguinhos. Ele resolveu usar o pior gesto que um cachorro pode usar para fazer amizades. Ele resolveu dar mordidas todas as vezes que não conseguia dizer o que queria ou todas as vezes que se sentia irritado com os coleguinhas.

As mordidas de Teteco doíam muito. Ele não sabia o quanto suas mordidas doíam, pois ele nunca havia mordido a si mesmo. Mas, seus coleguinhas sentiam a dor e ficavam zangados com Teteco todas as vezes que ele dava uma mordida. E, como ninguém gosta de ser mordido, Teteco passou a ter um problema muito sério. Seus amiguinhos foram se afastando dele e Teteco passou a ficar muito sozinho. Ninguém queria mais brincar com ele. Os cachorrinhos fugiam de Teteco todas as vezes que ele se aproximava. Ninguém queria mais ser mordido por ele. No começo Teteco até gostava, pois achava legal ser temido pelos amigos. Mordia, mordia, mordia sem parar... Recebeu o apelido de cachorro mordão.  Todo mundo passou a achar que Teteco era um cachorro mau. Os pais dos outros cachorrinhos diziam para seus filhos: - Se afaste daquele cachorro, pois ele é muito perigoso!

Mordendo tanto, Teteco passou a ser rejeitado pelos amigos e até por quem não conhecia ele direito. Ninguém queria ser amigo do cachorro mordão. E, quanto mais os cachorrinhos se afastavam de Teteco, mais agressivo ele ficava. Teteco passou a ter muita raiva, pois ninguém queria ser mais seu amigo. Agora, Teteco não mordia só quando não era compreendido. Passou a morder também por causa da sua raiva.

O tempo foi passando e Teteco além de raivoso foi transformando num cachorrinho muito triste. A tristeza que tomou conta de Teteco acabou lhe ensinado uma coisa muito importante. Ele descobriu que não adiantava nada ser temido se não era amado.  Descobriu que ficar sozinho sem amigos doía mais que as mordidas que dava nos outros cachorrinhos.

          Teteco precisava ser ajudado. Ele queria voltar a ser feliz como era antes de começar a dar suas mordidas. Ninguém sabia como ajuda-lo, pois todo mundo só queria ficar bem longe dele. E você, tem uma idéia para ajudar Teteco a resolver este problema?

Apesar de tudo, Teteco tinha uma família muito bonita. Seus pais eram muito carinhosos e atenciosos. Quando ficaram sabendo o que estava acontecendo com seu filho ficaram ainda mais tristes que Teteco. Mas, depois que a tristeza deixa seu recado a gente precisa deixar ela ir embora. E foi isto que os pais de Teteco fizeram. Mandaram a tristeza embora e chamaram o amor para ajudar a resolver este problema.

O amor mora no coração da gente. Se a gente deixar ele agir, ele nos apresenta soluções para todos nossos problemas. Mas, o amor que mora no coração de Teteco não estava conseguindo agir. Foi ficando fraco à medida que Teteco machucava seus coleguinhas com suas mordidas. Por outro lado, a raiva foi ficando cada vez mais forte e falando mais alto. A raiva fazia Teteco mostrar seus dentes pontudos. Agora, ele precisava aprender controlar a sua raiva para deixar o amor falar e agir. Só que  não sabia como fazer isto. Voce sabe?

Os pais de Teteco sabiam. Resolveram ajudar o filho. Sabiam que Teteco era um cachorrinho muito bom e amoroso, embora os outros cachorrinhos não estivessem vendo ele assim. Sabiam também que Teteco precisava mudar esta imagem ruim que os outros formaram dele. Ele precisava ser visto de novo como aquele cachorrinho amigo e afetuoso do passado. Foi assim que sentaram com Teteco para uma conversa muita séria.

No começo da conversa, Teteco não queria prestar atenção. Já estava se transformando também num cachorro rebelde. Olhava para o alto, tampava os ouvidos, corria pela casa fugindo da conversa. Tudo isto para não ouvir o que os pais queriam ensinar a ele. A rebeldia sem causa é muito perigosa. Não deixa a gente ouvir aquilo que vai fazer a gente ser feliz de verdade. Tem rebeldia boa e rebeldia má. Tem rebeldia que aciona mudanças e rebeldia que aciona vingança. A rebeldia má quer a gente ignorante. Voce sabe o que é ser ignorante? Ignorante é aquele que não querer aprender coisas novas. Além de agressivo, Teteco estava se tornando ignorante também. Mas, os pais de Teteco eram firmes. Sabiam como vencer a ignorância que desejava dominar Teteco. Pegaram nas patas de Teteco, olharam bem nos seus olhos e disseram:

- Meu filho, se não quiser dar atenção ao que nós vamos lhe dizer agora, voce corre o risco de perder a atenção de todos para sempre. É isto que deseja?

Teteco levou um grande susto. Ele era um cachorro muito inteligente e sabia que estava sofrendo por não conseguir ter mais a atenção dos amigos. Foi ficando cada vez mais carente, e carente de amor foi se transformando num cão vingativo. Vingava a sua carência mostrando os dentes. Queria a atenção deles de volta e não queria perder também a atenção dos pais e de todas as pessoas que podiam lhe ajudar. Um cachorrinho inteligente sabe fazer boas escolhas. E foi isso que Teteco escolheu. Escolheu ouvir seus pais e se permitir ser ajudado por eles.

Os pais de Teteco lhe explicaram, pacientemente, a causa de todos os seus problemas. Ao ouvir seus pais, Teteco compreendeu que estava dando motivos para seus amigos se afastarem dele. Para resolver o problema, aceitou fazer algumas coisas importantes para ganhar de volta todas as amizades que tinha perdido. Teteco compreendeu que para ganhar algo é necessário dar alguma coisa em troca. Compreendeu, também, que estava sendo egoísta. Voce sabe o que é ser egoísta? Egoísta é aquele que só pensa nas coisas que são boas para ele. Teteco descobriu que precisava olhar um pouco para as coisas que os amiguinhos gostavam também. Precisava agradar não só a si mesmo, mas aos amigos também.

Os pais de Teteco arranjaram um professor para ajuda-lo a latir melhor. Seu amiguinhos não compreendiam o latido de Teteco. Com as aulas de latido, ele aprenderia a se comunicar melhor e seria compreendido por todos. No entanto, Teteco descobriu que antes de apender a latir precisava a aprender a ouvir. Descobriu que não latia bem porque não queria ouvir direito o que o latido dos outros falava. Aceitou ouvir com atenção o latido dos pais, dos professores e de todos os amiguinhos.

Os pais de Teteco também lhe ensinaram a importância de mostrar os dentes do amor e não os dentes da raiva.  Teteco estava viciado em mostrar os dentes da raiva. Dentes de raiva assustavam e afastavam os outros cachorrinhos. Descobriu que para mostrar os dentes do amor precisa fazer uma coisa muito simples e muito gostosa – precisava sorrir para todos e para si mesmo todos os dias.

Teteco aprendeu também a pedir ajuda às autoridades caninas todas as vezes que não conseguisse resolver um problema com algum cachorrinho rebelde, difícil de lidar. Autoridades caninas são cachorros adultos e responsáveis pelas crianças. São os nossos pais, professores, enfim, qualquer adulto que zele pela nossa segurança. Descobriu que a ajuda dos cachorros adultos poderiam ser mais eficientes do que as suas mordidas. Descobriu que quando não conseguisse colocar limites a um coleguinha, um adulto poderia fazer isto por ele. Voce sabe o que é colocar limites? Colocar limites é impedir que o outro faça algo que possa não lhe fazer bem. Teteco descobriu que poderia aprender a colocar limites observando os adultos fazerem isto e  que morder sempre foi a pior maneira de colocar limites.

Por fim, Teteco descobriu que ter paciência era a coisa mais difícil de aprender. Voce sabe o que é ter paciência? Ter paciência é ficar em paz, tranquilo e feliz mesmo quando as coisas não saem do jeito que a gente quer. É também aprender a esperar a hora certa para conseguirmos o que desejamos. Teteco descobriu que não podia ter sempre as coisas na hora que desejava. Não gostou muito disto, mas aprendeu que as coisas são assim para todos e que precisava aceitar esta regra da vida. Talvez este fosse um limite da Dona Vida, autoridade máxima que devemos respeitar.

Descobrindo tanta coisa importante e seguindo cada passo ensinado por seus pais, professores e pela Dona Vida, Teteco se transformou num cachorrinho simpático, amado e apreciado por todos. Aprendeu a ouvir e a latir tão bem que passou a ensinar aos coleguinhas a arte de latir. Ninguém sabia latir tão bem quanto ele. Dividia com todos tudo que sabia e os brinquedos também. Distribuía sorrisos e conseguia resolver quase todos os seus conflitos com alguns cachorrinhos rebeldes parecidos com ele no passado. Quando o problema esquentava, pedia ajuda às autoridades e à sua paciência também. Jamais recorreu às mordidas, aliás, tinha até vergonha de ter um dia usado este método tão ruim.

Agora, os pais dos outros cachorrinhos diziam para seus filhotes: - Seja amigo do Teteco!  Olhe para ele e  aprenda  a ser um cachorrinho do bem!

Teteco viveu feliz para sempre, certo de que os problemas são bem vindos quando a gente aprende a lidar bem com eles. De cachorrinho mordão, Teteco passou a ser chamado de meu amigão.














segunda-feira, 2 de abril de 2012

O MONSTRO

Dedico esta história aos monstros e a todas as feras contidas dentro da gente. Dedico também,  ao nosso heroico domador de todas elas.
 
Era uma vez uma caverna muito escura que habitava um monstro misterioso que todos temiam. Ninguém tinha coragem de enfrenta-lo, por isso, dificilmente alguém se arriscava entrar caverna adentro. Só que o monstro não se contentava em permanecer quietinho dentro da caverna; de vez em quando ele saía e fazia inúmeras vítimas, ferindo-as, amedrontando-as ou escravizando-as. Assim, quando ele dava sinal de vida, a maioria das pessoas fugia para não ver, nem sequer, a sua cara. Corria a lenda de que o monstro hipnotizava suas vítimas e fazia delas o que bem entendesse. Era egoísta, egocêntrico, totalmente voltado para os seus mais cruéis desejos de poder e dominação.
Mas, para todo vilão existe um herói, e é dele que vamos falar agora. O herói sabia da existência do monstro, jamais a negava fugindo dele ou  dizendo que ele não existia. O herói sabia que o mundo não é feito só de rosas; há também os espinhos. E, este monstro era como os espinhos de uma rosa; a parte que fere, mas que a rosa criou para se proteger de outros monstros ainda mais terríveis . Sabia também que se não desejasse e se  tivesse determinação e firmeza, jamais poderia ser hipnotizado. Só é hipnotizado quem se permite. Ciente disto,  resolveu enfrentar o monstro. Não passaria a vida inteira negando a existência do mesmo, fugindo, ou fingindo que ele não existia. Encaminhou-se para a porta da caverna onde existia uma placa advertindo os mais afoitos: “Cuidado, você não vai gostar do que vai ver”.
O herói era sábio o suficiente para saber que precisava enfrentar aquilo que lhe perseguia, mesmo que não gostasse nem um pouco de tais coisas  por mais assustadoras, ocultas e desconhecidas que pudessem ser. Assim, deu o seu primeiro passo caverna adentro. De imediato, ouviu um urro do monstro querendo assustá-lo e intimida-lo. A maioria das pessoas fugiria, mas ele era um herói. Seguir em frente era seu lema! Deu mais um passo caverna adentro. Ele venceria o barulho do monstro com seu silêncio. O silêncio do herói atordoou o barulho do monstro, mas ainda assim o monstro não se deu por vencido. Resolveu usar sua última tática que era mostrar a sua terrível cara. Dizem que dificilmente alguém suportava. A repulsa que provocava fazia qualquer um ter crises de pânico,  náuseas e fortes dores que atordoavam o corpo e a alma. Repentinamente, o monstro apareceu frente a frente com o herói. Ele ficou assustado e surpreso. Estremeceu-se, mas não se permitiu pender. Tornar-se vítima ou herói? Embainhar-se com a covardia ou com a coragem? Procurou lembrar-se da rosa para enfrentar os espinhos. Lembrando-se que as rosas não são feitas só de espinhos, olhou bem fundo nos olhos do monstro. Não precisou de palavras, nem mesmo de movimentos para abatê-lo. Viu que a cara do monstro mostrava uma aparente maldade fantasiada de terror. Mas, no fundo de seus olhos existia muito medo. Era como se o medo se travestisse de violência para enfrentar o mundo.  Ali, bem à sua frente, o monstro curvou-se diante do olhar profundo de um  herói que compreendia a sua malignidade sem desejos de destruí-la ou vence-la.
Depois disto, o herói saiu da caverna sem o monstro. Deixou-o lá, quietinho. O monstro não perturbaria mais aquele herói, pois este sabia perfeitamente como controla-lo e doma-lo. E, o herói sabia que aquele monstro não fora criado para ser destruído, mas apenas para ser cuidadosamente domado e quem sabe um dia, transformado.