segunda-feira, 16 de abril de 2012

SEGREDO DO CORAÇÃO

 Dedico esta história a todos aqueles que não desvendaram ainda o seu segredo mais profundo


Era uma vez uma alma muito especial, daquelas que possuem uma luz diferente. Almas assim são escolhidas para missões muito importantes. No dia dela partir para a terra, o seu anjo da guarda guardou em seu coração um segredo, advertindo-o:
- O segredo só será revelado no dia em que você descobrir a chave do seu coração. Deverá partir e a sua missão lá na terra será, sobretudo, descobrir este segredo. Toda vez que você se distanciar desta missão o seu corpo irá lhe lembrar, principalmente, o seu coração.
-O que deverei ser? Perguntou cheio de curiosidade.
-Seja o que quiser. Terá muitos talentos e não será nada fácil exprimi-los. O seu talento também lhe mostrará a chave do seu coração.
E assim, aquela alma partiu para a terra. Nasceu um homem. Quando criança se posicionava de uma forma um pouquinho diferente das outras. Não tinha talento para o futebol, como a maioria, e não gostava de dar uma de machão. Sofria, pois é um sufoco ser diferente da maioria. Tinha inspiração para a arte, mas não lhe era concedido o direito de expirar o seu talento para o mundo. Inspirando, inspirando, inspirando, sem, contudo, expirar, transformou-se num asmático. Passou a ter alergia de um mundo que não desejava respirar, o mundo que a maioria dizia ser correto. Que sufoco viver assim! Se corria para o mundo do seu talento, o mundo lá fora rejeitava e reclamava, por outro lado, se dirigia a este mundo de fora, o seu corpo berrava. A quem agradar? Para viver tranquilamente achou que deveria convencer as pessoas que o seu mundo artístico era saudável e rico. Cresceu tentando convence-las e foi se esquecendo de convencer a si mesmo de que era uma pessoa especial, iluminada e talentosa. Buscava o seu brilho nos olhos opacos de pessoas que jamais conseguiriam ter sensibilidade para a arte. Convencimento foi se tornando a sua meta principal, no entanto, esta parecia não ser a chave do seu coração, pois ao invés de ouvir os elogios que tanto desejava, ouvia a voz exaltada do seu coração e os gritos de seu corpo dilacerado por sintomas insuportáveis tentando lembrá-lo de sua verdadeira missão. Tendo também que engolir muita coisa que não concordava, fez  o seu estômago falar mais alto: – “Toda vez que você engolir aquilo que deseja vomitar, eu vou gritar”.
Esquecido de que o seu corpo lhe serviria de mensageiro pela vida afora, buscava nos médicos uma explicação biológica para os seus problemas. Sempre encontrou, pois é esta a missão da medicina – “descobrir doença onde a gente cultiva”. Passou a cultivar tantas doenças que foi se esquecendo da sua missão – encontrar o segredo guardado no seu coração.
Perdido, criou a ilusão de que se ficasse o dia inteiro desenvolvendo apenas o seu mais notável talento, chegaria a ficar igual a alguns mestres, podendo finalmente convencer. “Convencer” tornou uma obsessão e não um resultado. Bastava esta palavrinha surgir em sua mente para o seu corpo berrar. E, tinha mais... Toda vez que se deparava com alguém convencido, seu corpo voltava a gritar. Parecia dizer:
-Olhe que ridículo! O caminho não é este.
O mais engraçado nesta história, é que esta linda alma morria de medo de dar um ataque do coração, pois, inconscientemente, sabia que lá estava escondido o seu segredo. O seu coração gostava de brincar com este seu medo. Queria vê-lo mais corajoso, assim, de vez em quando, só para desafia-lo, simulava uns ataques. Deixava, inclusive, a pressão subir de forma proporcional à pressão que ele exercia sobre si mesmo.
O tempo foi passando e a desilusão foi batendo à sua porta. Já estava ficando insuportável viver quando finalmente foi visitado por um gênio que carregava em suas mãos uma preciosa lâmpada. Surgiu como num encanto, exclusivamente, para lembra-lo:
-Você se esqueceu de buscar o seu segredo?
-Não. Mas, para alcança-lo eu preciso primeiro ser apreciado.
-Por quem?
-Por...
Naquele momento, como numa mágica, percebeu que já era apreciado por muita gente.
-De quem você precisa? Perguntou o gênio num tom de desafio.
-De...
-Você precisa do mundo inteiro batendo palmas para você? Vou lhe conceder a graça de três pedidos. Tudo que pedir lhe será dado.
Naquele momento seus olhos se encheram de luz. No entanto, antes que começasse a fazer seus pedidos, seu corpo começou a gritar. Foi parar no hospital e perdeu o gênio de vista.  Desiludido, pensava inconformado:
-Agora que eu iria realizar o meu desejo...
Transcorreu muito tempo e o gênio voltou.
-Por que você desapareceu logo na hora que eu iria fazer o meu primeiro pedido?
-O primeiro pedido foi feito pelo seu corpo. Pediu que eu voltasse agora e eu voltei para lhe conceder a graça dos outros dois que faltam.
-Qual foi o pedido feito por meu corpo? Perguntou exasperado e colérico.
-Seu corpo me pediu que eu fosse embora. Acho que ele percebeu que você faria o pedido errado naquela ocasião.
-Pedido errado? Isso é problema meu!
-Só seu, realmente. No entanto, parece que existe algo maior que deseja vê-lo livre deste problema.
-Que problema?
-Do problema que você criaria para você mesmo.
Aquele homem que às vezes agia como uma criança impulsiva e imatura ficou ali parado, pensativo, refletindo na imensidão de problemas que o atormentavam. A vida continuava sendo um sufoco. Percebeu que a frustração que o corpo lhe impusera talvez fosse uma forma de faze-lo parar, pensar e refletir. Se não fizesse o pedido certo, perderia os outros dois que lhe restaram, pois o seu corpo daria um jeito de interceder; o corpo ou algo maior do que ele. Depois de muita reflexão, fez finalmente o seu segundo pedido:
-Me tire do sufoco! Suspirou.
O gênio, acendeu a sua lâmpada mágica criando um alo de luz ao redor daquele homem já inconformado com aquela vida que parecia não dar certo.
-Está realizado o seu pedido, mas se desejar continuar no sufoco a escolha é sua.
-Não estou vendo nada de concreto.
-Verás. Mas, saiba vivenciar e utilizar a conquista advinda deste pedido de forma inteligente e para o seu bem. O que você ganha agora é seu por merecimento e não por piedade. Faça seu terceiro pedido.
Sem saber a procedência de palavras que brotaram de sua boca sem o seu controle, implorou:
-Desejo encontrar a chave do meu coração. Preciso desvendar um segredo. Acho que este segredo é a minha salvação. Não suporto mais afundar nesta lama de problemas...
Antes que prosseguisse o gênio completou.
-Que você mesmo criou.
-Pode ser... sei lá. O que importa é que não quero isto mais. Chega!
Mais uma vez o gênio esfregou a sua lâmpada mágica e disse:
-A chave do seu coração já está nas suas mãos desde o nascimento. Use-a.
-Mas, eu não consigo ver nada.
-Mas, já é suficiente saber que ela está nas suas mãos.
Finalizada estas palavras o gênio desapareceu.
-A chave do meu coração está nas minhas mãos... Se desejar continuar no sufoco a escolha é sua...Repetia, incessantemente, para si mesmo.
Sem desejar ter controle de tudo, principalmente da visão que julgava ser saudável as pessoas possuírem sobre a vida e sobre si mesmo, deixou finalmente a vida transcorrer livremente. Como num passe de mágica, muitas conquistas aconteceram. A sua vida financeira mudou, arranjou um novo amor, realizou antigos projetos e viagens sonhadas desde a sua infância. Apesar de tudo, o sufoco continuava. A frase do gênio se repetia em sua cabeça como um disco arranhado. “Se desejar continuar no sufoco a escolha é sua”...
E, a chave do seu coração? Estava nas suas mãos e não conseguia enxergá-la. Sem enxergá-la, como poderia usa-la? Sem utiliza-la como poderia desvendar o seu segredo? Precisava de uma resposta e o seu inconsciente tratou de agir rápido. Trouxe num sonho uma mensagem que desvendava uma parte do seu conflito. Sonhou que um monstro horrível chamado idéia o perseguia em todas as fases de sua vida. Tomado por um medo incontrolável, se viu criança, adolescente e adulto perseguido por este monstro terrível. Acordou com o coração palpitando fortemente, tomado por uma taquicardia semelhante à palpitação desprazerosa experimentada em suas crises de ansiedade. À partir daí, novos questionamentos transbordaram em sua mente.
-Em meio a tantas ideias boas e ruins, preciso separá-las e identificar as idéias negativas que me perseguem desde a infância.
Resolveu criar elos de identificação numa tentativa de conseguir uma resposta. Procurou se lembrar com qual criança mais se identificou pelas caminhadas de sua vida. Lembrou-se de um garoto inteligente e vivaz considerado,  porém,  medíocre e tímido pela maioria. Conheceu este garoto em uma de suas viagens e conseguira despertar a essência adormecida do mesmo oferecendo de presente a companhia da sua criança também tão reprimida e incompreendida no passado. A identificação destas crianças discriminadas pelo meio em que viviam tornou-se o principal elo de libertação para ambas.
Transitando por sua adolescência deparou-se com o conflito de sua enteada adolescente diante do desejo de tomar a arte como trajetória de vida. Brincando, assumindo o papel do pai incrédulo e do opressor de talentos, desestimulava aquela adolescente de alma artística a seguir o seu caminho, mostrando o seu espelho como um obstáculo de difícil transposição. Mas, parece que a sua brincadeira não assustou a adolescente que utilizou este espelho como a sua referência mais importante e um grande estímulo para seguir em frente. Que ironia! De repente se viu transformado num exemplo de vida. Tão empacado durante a mocidade, se viu repentinamente transformado num estímulo para quem deseja prosseguir.
E o seu adulto, com quem se identificava? Pensou em seus ídolos – pessoas que jamais o utilizaria como instrumento de libertação e estímulo. Inatingíveis? Certamente. Percebeu que precisava atingir primeiro o adulto frustrado que residia dentro de si, mostrando a ele o seu talento e não somente o talento dos mestres que tanto apreciava. Precisava construir uma vida para este adulto bem diferente da vida dos grandes astros. Não poderia viver de obsessões, precisava viver também os anseios de seu coração. Ele desejava uma vida iluminada pelo amor e não pela fama. A sua mente poluída pela idéia de ser um astro que convencesse não conseguiu convencer e nem realizar o seu intento. Chegara a hora de deixar o amor imprimir em sua mente uma idéia diferente – a idéia de que era um ser genial. GE- NI- AL!!!!!!! Deu uma grande risada ao perceber que o gênio da lâmpada era ele próprio. Este gênio só apareceu quando cedeu um espaço de luz para a sua mente sábia se expressar. Despoluída, ela poderia agora escolher os desejos certos. Percebeu que ao esfregar a lâmpada mágica esfregara, na verdade, a sua mente, as idéias sujas, deixando-as finalmente cristalinas.
Num passe de mágica tudo mudou. Passou a se permitir criar e vivenciar tudo que, anteriormente, sua mente suja não permitia. A vida passou a ter mais encanto. O corpo parou de gritar e o seu coração agora só palpitava de amor; uma palpitação diferente, forte, porém, gostosa de sentir. Pôde também respirar profundamente. Que alívio!
Depois destas encantadoras descobertas pôde enxergar a chave do seu coração. Ela estava realmente nas suas mãos. Só que não precisava mais dela para desvendar o seu segredo. Ao desvendar-se desvendou-o concomitantemente. Finalmente teve a absoluta certeza de que sua maior missão era ser feliz, muito feliz.

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