segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

LIBERTE SUA CRIANÇA

Dedico esta história ao chamado de nossa criança interior solicitando-nos a viver a paz do aqui e do agora




De repente, me dei conta de que precisava ir a busca da paz. Resolvi fazer uma viagem pelo mundo certo de que a encontraria em algum lugar. Pensava que se estivesse em paz tudo estaria resolvido, pois são justamente os problemas que não conseguimos resolver que nos deixam em conflito. Queria nesta busca descobrir se a paz é que resolve nossos problemas ou se é a resolução de nossos problemas que nos deixa em paz.

Quando, finalmente, decidi sair pelo mundo reuni com minha família informando-a sobre esta minha importante viagem. Deixei claro que ficaria um bom tempo distante deles para tentar encontrar a paz em algum lugar e assim que a encontrasse voltaria com ela ofertando-a a todos. Curioso, meu filho mais novo perguntou:

—Papai, o que é paz?

Não tive naquele momento uma resposta para uma pergunta tão simples e ele me questionou novamente:

—Se não sabe o que é paz, como poderá encontrá-la?

Sentindo-me envergonhado com o questionamento de uma criança tentei dar-lhe a todo custo uma resposta:

—Na verdade, a paz é um estado de harmonia e tranquilidade.

Como toda criança, ele me fez uma nova pergunta:

—E o que é harmonia e tranquilidade?

Percebi que se tentasse apenas buscar conceitos para responder suas perguntas ficaríamos eternamente presos em definições. Achei que seria mais prudente dar-lhe uma resposta buscando uma experiência concreta.

—Toda vez que estamos bem alegres sem pensar em nada que nos perturbe, estamos em paz.

Neste momento os olhinhos de meu filho se encheram de luz. Foi como se tivesse feito a maior descoberta de sua vida. Cheio de entusiasmo, falou:

—Já que esta paz que procura é tão importante, eu posso ajudá-lo a encontrá-la. Você não precisa rodar o mundo, ela está aqui, eu a conheço e brinco com ela todos os dias. Amanhã deixarei que brinque com ela também; ou agora, se preferir.

Tentando brincar com meu filho e não dando tanta credibilidade ao que falava por julgá-lo inocente e ingênuo, o censurei com doçura:

—Mas, como é que você não me apresentou ela até hoje?

—Por dois motivos, papai. Primeiro, porque você nunca me falou que a procurava, talvez estivesse mais preocupado em procurar problemas. E segundo, porque apesar de brincar com ela todos os dias nunca me preocupei em perguntar o seu nome, me sentia satisfeito com o simples fato de tê-la ao meu lado.

Fiquei chocado com o que ouvi. Nunca pensara que meu filho, na condição de criança, pudesse estar atento à forma como eu vinha conduzindo minha vida. Percebi que o ingênuo ali era eu e que a inocência talvez fosse um atributo importante para quem deseja a paz. Na verdade, só os inocentes conseguem senti-la. Quem não vive a inocência, se sente culpado e vive em conflito constante consigo próprio. Sem perceber que era um mestre a criança que eu pensara educar, acabei recebendo ali uma lição de vida. A simplicidade era tanta que cheguei, no meu íntimo, achar impossível encontrar a paz que eu julgava tão complexa na pureza de uma criança. Mesmo assim, combinamos encontra-la no outro dia. Iria muito mais para cumprir o dever de um pai no sentido de julgar-se interessado pelas coisas do filho do que na esperança de ser realmente apresentado à paz por uma simples criança.

No outro dia meu filho tomou-me pela mão e saiu comigo rumo às montanhas. Durante a caminhada ele me falou assim:

—Hoje, nós combinamos brincar de voar como os passarinhos. Ontem, nós brincamos de nadar como os peixes no rio. Foi ótimo!

—Me fale de tudo que vocês costumam brincar. Perguntei, curioso, tentando desvendar as fantasias de uma criança.

—A gente brinca de ser... De ser... De ser, sei lá... Ser... Ele não conseguia complementar a sua resposta.

Percebi que sua resposta talvez não tivesse mesmo um complemento. Talvez fosse simples o suficiente para a nossa mente adulta querer complicar. Brincar de SER seria a resposta. Não tentei complicar a questão, na verdade nem tive abertura para isto, pois antes que me desse conta, meu filho já estava lá no alto da montanha com os braços abertos prontos para voar como um pássaro. Desceu correndo, batendo os braços e dando gargalhadas de soluçar. Chegou, finalmente, junto a mim e pediu que voasse também. Tentei, mas não senti a harmoniosa sensação que meu filho demonstrava. Decepcionado, ele olhou-me nos olhos e disse:

—Talvez, você prefira planar...

Levou-me até o alto da montanha novamente. Tirou as roupas, fechou os olhos, abriu os braços e se limitou a ficar quietinho apenas sentindo o vento tocar em seu corpo. Tentei fazer o mesmo, mas achei-me ridículo. Abri meus olhos e encontrei a paz, não em mim, mas em meu filho. Descobri que ela era muito mais do que a tranquilidade e harmonia; era, na verdade, a genuína alma de uma criança. Tive a plena consciência de que enquanto eu estivesse fechado e achando ridículo o que era demasiadamente simples e belo, jamais conseguiria encontra-la. Era necessário me abrir. Antes de voar, talvez precisasse abrir meus braços para acolher o que sempre rejeitei. Naquele momento abri meus braços para abraçar meu filho e lhe disse com fervor:

—Obrigado filhinho! Adorei a sua companheira, no entanto preciso ainda aprender a brincar com ela. Acho que estou pesado demais, não consigo voar e nem planar.

—Por que você ficou pesado, papai?

—Acho que é porque virei gente grande.

—Desse jeito eu não vou querer crescer, eu vou querer ser sempre uma criança.

—Pois eu lhe digo uma coisa muito importante, meu filho. Você pode crescer sem receios, só não pode deixar nunca de ser uma criança também.

—Tem jeito de ser gente grande e criança ao mesmo tempo? Perguntou-me confuso.

—Acho que sim. Preciso descobrir. Acho que preciso ir atrás da criança que mora dentro de todos nós, principalmente aquela que mora dentro de mim. Se eu encontra-la, com certeza ela estará assim como você, de mãos dadas com a paz e brincando com ela todos os dias.

Foi assim que resolvi sair pelo mundo em busca da criança. Passei por campos de guerra e vi a criança bombardeada nos corações dos homens. Estava muito ferida e não conseguia se exercer. Na maioria dos combatentes ela já havia morrido. Passei pela miséria e vi a criança desnutrida e sem força. Não conseguia levantar-se e chorava de fome. Descobri aí, que para ser criança não basta ter pouca idade, pois vi muitos seres pequeninos carregando a senilidade dentro deles e mais à frente deparei-me com um idoso que trazia junto de si a criança mais levada que conheci. Todos diziam que ele havia caducado, mas ele me disse um grande segredo ao pé do ouvido que jamais esquecerei:

—Cansei de ser adulto. Se eu precisar ser um velho caduco para libertar a minha criança, serei. Não conte a eles que não estou caduco, pois senão me obrigarão a ficar, novamente, cego como eles que só enxergam a luta da vida. Sem enxergar, eu corro o risco de perder minha criança e se eu perde-la não terei paz enquanto não encontra-la novamente.

Saí dali pensando na minha luta para encontrar a paz. Que contradição! Passei também por templos religiosos. A criança não estava lá, somente pessoas sérias, e a paz eles afirmavam estar no paraíso. Ali, fiquei sabendo que o paraíso é um lugar muito distante onde mora um homem chamado Deus. Se o Deus deles pelo menos fosse criança, eu acreditaria no paraíso deles.

Tive contato com ambientes festivos onde vi de tudo. Vi pessoas brincando com sua criança e outras tentando alicia-la. Tive a oportunidade de observar muitas famílias educando suas crianças, ensinando a elas etiquetas de boas maneiras. Na maioria delas, boas maneiras para deixar de ser criança e deixar de ser feliz. Nos ambientes de trabalho, simplesmente, nunca houve espaços para a criança. Existem, inclusive, leis que proíbem o trabalho para criança. Sendo assim, no trabalho a gente aprende a ser apenas gente grande.

Depois de buscar tanto a criança, eu me perdi. Não sabia mais porque a buscava. A lembrança de meu filho e da paz que brincava com o mesmo todos os dias me ajudou muito. Cheguei à conclusão que faltava apenas eu olhar para dentro de mim mesmo e ter a coragem de correr o risco de libertar a minha criança. Não sei como, mas tive esta coragem. Quando me olhei com carinho e ternura a vi sorrindo para mim. Linda! Apesar de sapiente não sabia ainda se defender dos adultos. Ela me olhou com um olhar triste e disse:

—Estou de castigo.

—Por que? Perguntei.

—Porque deixei de fazer o dever de casa para poder brincar. Respondeu melancólica.

—Por que você não fez o dever de casa para brincar depois? Questionei, censurando-a.

—Porque além de chato ele é grande demais para mim e não sobra tempo para brincar.

Tomei um susto e a criança desapareceu. Parei para pensar no tamanho e na qualidade de meu dever e cheguei à conclusão que eu só consigo pensar no que devo fazer e nunca no que posso fazer. Devendo fazer tanta coisa eu passei a dever muito e perdi a paz com tanta dívida. Desde então, passei a buscar o que posso fazer diferente e vez e outra vejo minha criança reaparecendo para mim com um rostinho mais alegre dizendo:

—Parece que falta muito pouco para o castigo acabar!

Outro dia sonhei com ela e no meu sonho ela era um lindo anjinho com asinhas salientes prontas para voar. Depois deste sonho subi, novamente, a montanha com meu filho e consegui finalmente voar.

E se você não entendeu ainda esta história e deseja que eu lhe explique mais uma vez o que criança tem haver com paz, eu lhe respondo:

-Tudo!!!!!!!

E tem mais... Se você ainda tem esta dúvida é porque não tirou a sua criança do castigo.