domingo, 22 de julho de 2012

ENCONTRO


Dedico esta história a todos aqueles que possuem a coragem de mergulhar num mundo diferente para se tornar um pouco mais que o costumeiro jeito de ser e viver




Encontro

                                                  

Vou lhes contar a história de Marceu e Ceumar para que você possa  conhecê-los um pouquinho, pois, por um momento ou outro de sua vida, pode ser que acabe se deparando com a experiência que eles vivenciaram.

Marceu e Ceumar viviam em mundos bem diferentes.  Um morava no céu e o outro morava no mar. Por força do destino, acabaram se encontrando. Desejavam mergulhar no mundo do outro, mas, receosos, se perguntavam:

—Terei fôlego? Desejavam, também, que o outro mergulhasse em seu mundo e, novamente, se indagavam: — “Ele terá fôlego?”

Pior do que o dilema do fôlego era o dilema de uma dúvida que pairava na cabeça de cada um:

 — E se eu amar? Terei que abandonar o meu mundo para habitar o dele? Ele abandonaria o seu próprio mundo para habitar o meu? Que responsabilidade! Pesada demais para mim. Quantos riscos!

Tudo foi ficando pesado e confuso, quase chegou ao fim antes de ter começado, até que o tão temido amor chegou ao coração de cada um fazendo a sua primeira e única pergunta:

—Você se ama?

—No meio disto tudo, com o desconhecido me rondando, não sei se quero amá-lo. Respondeu Ceumar.

—Eu perguntei se você se ama e, não se você o ama. Corrigiu o Amor.

—É claro que me amo! Respondeu Ceumar cheia de convicção.

—Não parece... Questionou o amor.

—Por que?

—Porque tem concedido mais espaço ao medo do que ao amor dentro de ti. Justificou o Amor.

—Medo de que? Perguntou Ceumar.

—De amar o que vai encontrar. Afirmou o amor.

—Engano seu! Tenho medo de me decepcionar, de não gostar daquilo que vou encontrar.

—Se decepcionar tudo será bem mais simples. Não gostando do mundo dele, retorne ao seu e tudo voltará ao normal.

—Normal...Enjoei-me do normal, aliás, nunca gostei de nada que fosse normal demais. Refletiu Ceumar em voz alta.

—Foi por isso que se interessou pelo mundo dele. É diferente de tudo que voce vive. Talvez, por isso, quase nunca se interessa por pessoas do seu próprio mundo. Explicou  o Amor tentando analisar a situação de Ceumar.

—E se eu não gostar do mar, mas amar Marceu? Perguntou Ceumar receosa buscando uma orientação .

—Marceu e o mar são unos. Não tem como amar um e odiar o outro. O máximo que poderá acontecer é não gostar de algumas coisas do mundo dele. Esclareceu o Amor.

—Acho que é isto que eu queria dizer... Me diga o que fazer quando nos deparamos com  coisas que não gostamos no mundo do outro. Solicitou Ceumar buscando um esclarecimento maior.

—Tem tantas coisas que você também não gosta no seu próprio mundo, nem por isso você deixa de vivê-lo. Coisas são coisas; controláveis e manipuláveis. Só não deverá deixar estas coisas controlar e manipular você. Advertiu o Amor.

—Não há nada que me controle! Afirmou Ceumar convicta.

—Só você, né. Questionou o Amor tentando conceder a Ceumar uma reflexão maior sobre si mesma.

—Ãhhhh!!! Sussurrou surpresa.

—Você vive se controlando e não percebe. Solte-se, flua! Deixe que as coisas que você não gosta possam fluir também. Muitas se resolvem sozinhas sem que a gente tenha que fazer alguma coisa. Orientou o Amor.

—Que coisas são essas? Perguntou Ceumar, cheia de curiosidade, achando que o amor pudesse lhe dar alguma resposta.

—Só mergulhando no Mar para ver. Sugeriu o Amor.

—Isso vai dar um trabalho...Refletiu Ceumar.

—Se tiveres energia para o trabalho, saberá que todo trabalho resulta numa produção e a produção em lucro.

—Sairei lucrando? Perguntou Ceumar.

—Se souberes investir...Desafiou o Amor.

—Tem investimento que dá prejuízo. Conjeturou Ceumar.

—Você está com medo do prejuízo. Indagou o Amor.

—Acho que sim. Você entraria como meu avalista? Perguntou Ceumar buscando algo que pudesse lhe fornecer mais segurança.

—Se você compreender porque lhe fiz a primeira pergunta desta nossa conversa, talvez eu possa avalizá-la. Propôs o Amor.

—Amor, na verdade não entendi onde quiseste chegar ao perguntar-me se me amo. Dá para explicar melhor?

—É claro! Se você se amar me terás naturalmente como teu fiador, pois estarei sempre depositado no banco do teu coração. Esclareceu o Amor.

Ceumar compreendeu tudo. Sabia que neste mergulho muitas mudanças poderiam acontecer, nem tanto em seu mundo, mas, sobretudo dentro dela mesma. Correu para o espelho, fitou-se e ficou se observando. Olhava-se fixamente tentando se enxergar melhor e pensava:

—O que eu quero mudar?

Do outro lado, em outro mundo, curiosamente, acontecia o mesmo diálogo do Amor com Marceu. Assim como Ceumar, ele também correu para o espelho. Diante dele, seu pensamento começou a mergulhar no mundo de Ceumar antes que seu corpo pudesse ir junto. Como Marceu nunca gostou de se dividir, se quer sempre inteiro, detesta rotinas entediantes, adora mudanças e aventuras, resolveu, finalmente, dar um mergulho no Céu de Ceumar. No primeiro mergulho, por precaução, não foi muito fundo e rapidamente voltou ao Mar. Passado algum tempo, sentiu saudade e deu o seu segundo mergulho no Céu. Desta vez foi mais fundo, mas voltou como da primeira vez. E assim, foi dando mergulhos sucessivos cada vez mais profundos. Foi amando o mundo de Ceumar e controlando as coisas que não gostava. Só não esquecia de mergulhar em seu próprio mundo assim que voltava.

Curiosamente, o mesmo acontecia com Ceumar lá do outro lado. E, com tanta coisa acontecendo conjuntamente, com tantos mergulhos compartilhados, eles passaram a ter muito um do outro. Somaram as diferenças e criaram juntos algumas igualdades. E, é por isso que quando a gente olha para o encontro do Céu com o Mar ou do Mar com o Céu, lá no infinito que demarca a linha do horizonte, a gente não sabe mais quem é um e outro. A beleza deste encontro chega a nos hipnotizar tomando conta de todos nós o desejo de lá chegar.

Depois de um final tão bonito, você deve estar se perguntando:

—Que lugar no infinito é este, onde eles se encontram?

Eu lhe respondo, com certeza, que é um lugar que não se chega nunca. E você, certamente, vai pensar:

—Que horror! Quem é que dá conta de não chegar nunca a lugar algum?

Eu lhe diria que os dois dão conta. Sabe por que? Porque depois de tantos mergulhos, descobriram que já estavam lá há muito tempo e não sabiam. Descobriram que a linha do horizonte sempre foi apenas uma referência para seguirem em frente; jamais um ponto de chegada e acomodação. Assim, seguiram. Seguiram certos de que jamais chegariam ao final, que tudo seria sempre um delicioso e surpreendente começo a ser experimentado e vivido. Destes começos um novo ser estaria sempre sendo parido. O constante nascimento de uma nova vida afastaria para sempre o medo da morte daquilo que ficou velho e não tem mais forças para sobreviver.




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